O Dia das Mães, celebrado todos os anos com flores, cartões e almoços especiais, tem uma história marcada por ironia. A mulher responsável por instituir oficialmente essa homenagem acabou se tornando sua maior opositora. Anna Jarvis, nome pouco conhecido por grande parte da população, foi a principal articuladora da criação da data — mas, ao ver seu propósito ser desvirtuado, passou a travar uma batalha solitária contra a forma como o feriado se transformou.
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As raízes do Dia das Mães: homenagem pessoal que virou movimento nacional
Quem foi Ann Reeves Jarvis
A inspiração de Anna Jarvis veio de sua mãe, Ann Reeves Jarvis, uma ativista comunitária da Virgínia Ocidental. Durante o século XIX, Ann organizou clubes de mães voltados para cuidados sanitários e ações sociais, inclusive durante a Guerra Civil Americana. Ela era uma defensora fervorosa da união familiar e do bem-estar das mães, e sua dedicação deixou marcas profundas em Anna.
A morte da mãe e o desejo de preservar seu legado
Em 1905, após a morte de Ann, Anna Jarvis se comprometeu a honrar sua memória. Seu desejo era instituir um dia de reconhecimento à importância das mães, algo que refletisse o amor e os sacrifícios feitos dentro das famílias. Para ela, o ideal era uma data para cultivar sentimentos e não para fins comerciais.
Da ideia à oficialização: o nascimento do feriado
Primeiras celebrações
A primeira celebração reconhecida do Dia das Mães ocorreu em 1908, organizada por Anna em uma igreja da cidade de Grafton, na Virgínia Ocidental. No mesmo dia, uma loja da Filadélfia promoveu um evento em homenagem à data. Jarvis enviou centenas de cravos brancos para os participantes, estabelecendo o símbolo da pureza e da devoção maternal.
Campanha nacional por reconhecimento
Nos anos seguintes, Anna se dedicou a uma campanha incansável para oficializar o Dia das Mães. Escreveu cartas, discursou, angariou apoios políticos e da sociedade civil. Em 1914, seu esforço foi recompensado: o presidente Woodrow Wilson declarou oficialmente o segundo domingo de maio como o Dia das Mães nos Estados Unidos. A data se espalhou para outros países, incluindo o Brasil, onde foi institucionalizada em 1932.
A virada: do sonho ao pesadelo
O surgimento da indústria do Dia das Mães
O que era para ser uma data íntima e emocional, logo virou uma oportunidade de negócios. A indústria de flores, fabricantes de cartões comemorativos e o comércio em geral começaram a explorar a data intensamente. Para Anna Jarvis, essa comercialização transformava sua homenagem em algo raso e interesseiro.
De criadora a opositora
Revoltada com o rumo que o feriado tomou, Anna mudou de papel: passou a criticar abertamente o Dia das Mães. Ela condenava a compra de cartões prontos — argumentando que era muito mais significativo escrever uma carta à mão — e rejeitava a ideia de presentear por obrigação. Para ela, o amor materno não deveria ser uma ferramenta de marketing.
Protestos e prisão: o ativismo radical de Jarvis
Tentativas de revogar o feriado
Durante as décadas de 1920 e 1930, Anna Jarvis liderou campanhas contra o que ela chamava de corrupção do Dia das Mães. Organizou protestos públicos, escreveu manifestos e chegou a tentar cancelar oficialmente a data que criou.
Conflitos com organizações beneficentes
Anna também se opôs a instituições de caridade e organizações religiosas que usavam o Dia das Mães para arrecadações. Ela acreditava que isso distorcia o propósito sentimental da data. Em um dos episódios mais marcantes, foi presa por tumultuar uma convenção de fabricantes de doces em Filadélfia, acusando-os de explorar comercialmente o feriado.
O fim da vida em contradição

Isolamento e decadência
Sem filhos, jamais casada e vivendo cada vez mais isolada, Anna Jarvis viu sua criação se distanciar totalmente daquilo que imaginava. Passou seus últimos anos internada em um sanatório na Pensilvânia, sem recursos financeiros.
Ironia final: quem pagou por seus cuidados
O que torna sua história ainda mais irônica é o fato de que suas despesas médicas foram arcadas por empresários da indústria que explorava o Dia das Mães — exatamente aqueles contra quem lutou por tanto tempo. Anna morreu em 1948, aos 84 anos.
O Dia das Mães hoje: entre tradição e comércio
A data mais lucrativa para o varejo
Hoje, o Dia das Mães é uma das datas mais importantes para o comércio mundial, movimentando bilhões em vendas. No Brasil, é considerada a segunda melhor data para o varejo, atrás apenas do Natal. Floriculturas, restaurantes, lojas de eletrodomésticos e e-commerce registram alta significativa no período.
Resta algo do ideal original?
Apesar do apelo comercial, muitas pessoas ainda veem o Dia das Mães como uma oportunidade para demonstrar amor e gratidão. Cartas, homenagens escolares e momentos em família resgatam, de certa forma, o espírito proposto por Anna Jarvis.
A importância de refletir
O legado de Jarvis convida à reflexão: estamos celebrando nossas mães por afeto ou por convenção? O verdadeiro presente pode estar em gestos simples e sinceros, não necessariamente em compras.
Considerações finais
A história de Anna Jarvis é uma poderosa lição sobre como boas intenções podem ser distorcidas pelo consumo desenfreado. Criadora do Dia das Mães, ela nos lembra que a homenagem às mães deveria ser mais do que uma data comercial — deveria ser uma manifestação genuína de carinho, respeito e reconhecimento. Em tempos em que tudo se torna produto, resgatar o significado verdadeiro do Dia das Mães pode ser um ato de resistência.