As crianças são cada vez mais cedo introduzidas ao mundo digital. Não é incomum ouvir de alguma pessoa mais velha que o filho, o neto ou sobrinho de pouca idade sabe lidar com um celular ou um computador melhor do que ela. Contudo, o que parece “bonitinho” para muita gente, pode ser um problema preocupante para as crianças, principalmente quando elas utilizam tais aparelhos na hora de dormir.
De acordo com uma pesquisa realizada pelo King’s College, de Londres, Inglaterra, com os dados de 125.198 crianças e adolescentes com idade entre 6 e 19 anos, o uso de celulares no horário reservado ao descanso está causando desde má qualidade do sono até doenças graves como obesidade e depressão infantil.
A preocupação é tanta que chegou, inclusive, às empresas. De acordo com informações da BBC, dois grandes grupos de investidores que contam com R$ 2 bilhões em ações na Apple solicitaram, em carta aberta, que a gigante tecnológica desenvolva softwares que possam limitar o uso dos smartphones ao público infantil. O pedido ainda não teve resposta.
Os males do celular
Em entrevista à BBC, a médica Roberta Magalhães vive o problema dos celulares em sua casa. Ela explica que a filha Roberta, de 9 anos, só desliga o celular na hora de dormir se ela tiver a atenção chamada. “Com certeza atrapalha. Ela fica horas navegando na internet, no Instagram, WhatsApp, Musical.ly, assistindo vídeos no YouTube. Depois demora a dormir. Fica rolando na cama”, explicou a mãe que afirmou que ao primeiro sinal de que o celular está começando a ser prejudicial à rotina da menina, vai proibir o seu uso.
Segundo os pesquisadores, além dos problemas em relação ao sono, os efeitos negativos do celular desencadeiam doenças. “Esse tipo de estudo endossa o que as pessoas de bom senso já sabiam. Os eletrônicos dão uma sossegada nas crianças por um tempinho mas, no médio e longo prazo, são muito ruins para o organismo”, alerta o médico especialista em doença do sono do Hospital Albert Einstein, Leonardo Ienardi Goulart.

Os estudos ressaltam as consequências perigosas dos distúrbios durante o sono. Dentre os principais problemas estão a obesidade, o enfraquecimento do sistema imunológico, problemas no crescimento e problemas psicológicos como a depressão, a ansiedade e um comportamento que tende ao suicídio.
Nesse momento, vale a consideração de um estudo feito na Grã-Bretanha pela Sociedade Real para Saúde Pública. Nele é mostrado que dormir mal é fator chave para doenças como o câncer e problemas cardíacos se manifestarem.
E no caso das crianças o sono se torna ainda mais importante. É durante o período de descanso que importantes hormônios se desenvolvem.
Como os aparelhos eletrônicos desencadeiam os problemas
São três os fatores principais que fazem com que os eletrônicos se tornem um transtorno para os mais jovens. O primeiro dele é a influência dele sobre o sono. O uso constante faz com que a criança atrase em seu horário de dormir e, naturalmente, tenha um tempo de descanso menor.
O segundo fator é o fato do conteúdo poder ser, muitas vezes, estimulante. Ou seja, isso acarreta uma sensação de excitação que atrasa o início do relaxamento da criança. Ela demora mais para conseguir pegar no sono. O caso de Roberta é um bom exemplo disso.
O terceiro fator determinante é a chamada “luz azul”, uma luz forte gerada pelas telas do smartphone que inibem a secreção da melatonina, o hormônio que diz ao cérebro que ‘é hora de dormir’. O preço disso é um relógio biológico afetado.
“O estímulo biológico para o sono fica prejudicado pela luminosidade. Porém o problema não é só a luz, mas também pensar em um monte de coisas, condicionando o momento do sono com a execução de tarefas sociais. Talvez isso atrapalhe mais do que a luz”, diz Goulart.

Transtorno a longo prazo
Segundo os especialistas, é a longo prazo que os transtornos mais sérios se manifestam e se tornam mais notáveis. E tão sérias quanto as manifestações são as consequências. Goulart explica à BBC que os aparelhos eletrônicos “podem gerar insônia. A pessoa fica condicionada àquele ambiente de alerta e daí, mesmo que ela vá para cama sem celular ou iPad, o cérebro acha que aquele é um lugar de vigília e não de descanso”.
A partir do momento que o sono é distorcido, hábitos como ficar acordado de madrugada se tornam mais evidentes. E pessoas que o seguem costumam, segundo pesquisas, ter a imunidade mais baixa.
“Há estudos que relacionaram mulheres que trabalham em turnos à noite com maior incidência de câncer de mama”, diz a neurologista Ana Karla Smith.
Ou seja, de tudo o que foi citado até aqui, é fundamental a compreensão de que o problema não se limita às crianças e aos adolescentes. Todos estão sujeitos.
Uma maior intensidade dos distúrbios do sono abre caminho para a depressão, AVCs, doenças cardiovasculares, dentre outros quadros de saúde letais. Além disso, é muito comum que os pacientes apresentem cansaço e mau humor com maior frequência.

Como se proteger
Falamos tanto a respeito dos riscos, mas não nos esquecemos do mais importante: a prevenção. A principal recomendação, claro, é moderar no uso dos eletrônicos e evitá-los ao máximo antes do sono. Pais devem se atentar não somente aos filhos, mas também a si próprios. E é importante ter cuidado na introdução cada vez mais precoce dos pequenos aos acessórios tecnológicos.
No caso da luz azul, já estão sendo lançados óculos com lentes especiais para reduzir os danos causados por elas. Existe, inclusive, aplicativos que alteram a cor das telas. A empresa Caruso’s Natural Health lançou uma vitamina que promete proteger os olhos da luz azul, mas ainda não se sabe se ela realmente cumpre com o que diz.
Fonte: G1 / BBC












