Para conquistar seu lugar ao sol, Marilene Silva, 42, hoje técnica judiciária no Tribunal de Justiça do Distrito Federal, precisou batalhar muito. Um dia, ou melhor, por uma vida, seu destino foi incerto. Catadora de latinhas na capital federal, Marilene passou por muitas dificuldades – fome, frio, mal ter o que vestir – ao lado de seus filhos para que, enfim, todo o seu esforço e sua luta fossem recompensados.
Apesar de tudo, o cenário da realidade de Marilene nunca foi impedimento para que ela sonhasse com dias melhores para si e para sua família. E tudo começou a mudar quando sua mãe comprou uma apostila para ela e suas irmãs. Ali, se formava um grupo de estudo familiar que mudaria de vez a vida de Marilene.
2001 foi o ano da mudança. Para quem até então ganhava apenas R$50 por dia coletando latas pelas ruas, agora ela teria um verdadeiro recomeço ao ser aprovada no concurso para o TJDFT.
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Foto: Marilene Lopes / Arquivo pessoal
Um novo recomeço
Marilene nunca se acomodou com a sua difícil realidade. Durante os 12 anos em que se viu diante de um grande esforço para sobreviver, ela nunca deixou de se concentrar em seus estudos. Conquistar a vaga como técnica judiciária não foi sorte ou acaso, mas sim, um prêmio para quem tanto lutou por isso.
E hoje, ela simplesmente não para. Casada há 2 anos e mãe de 5 filhos, Marilene é uma mulher bastante firme e que sabe exatamente o que quer. Desde sua entrada no Tribunal, ela sempre buscou se aperfeiçoar e realizar cursos: “Tudo o que eu recebo, textos, artigos, o que chega em meu e-mail, eu faço questão de ler, assim vou aprendendo cada vez mais”, conta ela.
Para a técnica, o céu é o limite. Sua constante busca por conhecimento é o retrato de uma mulher que sempre quis mais para sua vida. Afinal, se você pode sempre melhorar e evoluir, seja pessoal ou profissionalmente, por que parar no meio do caminho, não é mesmo?
Ela ressalva que o mais importante é poder dar uma vida digna para seus filhos. Inclusive, dos cinco, os quatro que são maiores de idade foram aprovados para o TJDFT. E isso teve o papel da mãe? Sem dúvida, porém não no local de trabalho, mas sim, dentro de casa, transformando a sua história – a qual tanto ela quanto eles têm muito orgulho – em inspiração para eles também alcançarem seus próprios (e altos) vôos.
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Foto: Marilene Lopes – Arquivo Pessoal
Preço da fama
Quando a história de alguém é contada, nem sempre a ‘fama’ traz consigo apenas coisas boas. Assim que a primeira matéria com Marilene foi divulgada, os problemas começaram.
Na época, vivendo em uma invasão em Águas Claras, não demorou para sua história se espalhar. E o fato de matérias divulgarem o seu salário não foram nada bem-vindas: “De repente as pessoas acham que você ficou rica, que está cheia da grana e começam a te olhar de forma diferente”, afirma.
E quando ameças de sequestro quase se concretizaram – visada, ela quase foi capturada -, ela percebeu que era hora de se mudar.
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Foto: Flickr / Reprodução
LIBRAS
A linguagem de sinais vem ganhando um papel fundamental na vida de Marilene. “Por causa de calos nas minhas cordas vocais, eu corro até o risco de perder a minha voz. Mas se acontecer, não vou ficar triste. Quero me especializar em libras e estou prestes a fazer minha faculdade”.
Seu marido, Danilo, tem problemas auditivos, tendo apenas um pouco de audição em seu ouvido direito. E em breve ele também começará a aprender linguagem de sinais ao lado da esposa.
Verdadeiramente, a linguagem de sinais é algo que encanta Marilene. Escolhida como conselheira em sua comunidade para projetos de ação penal, ela trabalha em visitas a presídios, onde busca levar aos presos cultura, teatro, estudo e o aprendizado de LIBRAS. “Linguagem de sinais deveria ser tratado como um segundo idioma, por ser o que ela realmente é”, comenta. E além do trabalho com presidiários, ela faz questão de levar o ensino da linguagem para crianças e para dentro de igrejas, além, claro, do TJDFT: “O tribunal até contratou intérpretes para darem cursos internos e reconhecidos pelo MEC”, conta, orgulhosa.
Preconceito e próximos objetivos
Como no Brasil o que não falta é gente preconceituosa, Marilene também já precisou enfrentá-las. “Eu já sofri preconceito das pessoas, mas não do pessoal que trabalha comigo. E eu sempre lutei muito para chegar até aqui, então, não são essas pessoas que cometem preconceito que vão causar algum efeito em mim. (…) Eu evoluí muito como pessoa”, diz a técnica judiciária.

Uma de suas principais metas para o futuro é continuar trabalhando na recuperação de presos e buscar abrir ainda mais portas em sua carreira. Marilene frequentemente é convidada para dar palestras e tem até o seu próprio canal no YouTube, onde dá dicas para concursos. Para conhecê-lo, basta clicar aqui.
“Hoje sou uma pessoa feliz e que busca alcançar vôos ainda maiores. E eu sei que vou cumprir as minhas metas”, completa Marilene.


Foto: Marilene Lopes / Arquivo pessoal
Foto: Marilene Lopes – Arquivo Pessoal
Foto: Flickr / Reprodução









