A visão de que o autismo é um único diagnóstico está sendo revista pela ciência. Um estudo divulgado em 2025 trouxe evidências de que o Transtorno do Espectro Autista (TEA) pode ser dividido em quatro subtipos diferentes, cada um com características próprias em termos de comportamento, desenvolvimento e até origem genética. Essa descoberta abre novas possibilidades para a prática clínica: diagnósticos mais precisos, intervenções sob medida e políticas públicas melhor direcionadas. Também reforça a ideia de que o autismo é múltiplo, variado e complexo, exigindo olhares diversos para garantir o apoio adequado.
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O TEA e seus desafios
Definição básica
O Transtorno do Espectro Autista é uma condição do neurodesenvolvimento caracterizada por dificuldades de comunicação, padrões restritivos de comportamento e desafios de interação social. Embora esses sejam traços comuns, a forma como se manifestam varia muito de pessoa para pessoa.
Por que é difícil diagnosticar
Hoje, o diagnóstico de TEA depende majoritariamente de observações clínicas, escalas comportamentais e relatos de cuidadores. A ausência de marcadores biológicos claros faz com que crianças com perfis muito diferentes recebam a mesma definição, o que nem sempre ajuda a planejar intervenções personalizadas.
A hipótese da heterogeneidade
Pesquisadores há anos suspeitam que o espectro seja, na verdade, um conjunto de condições diferentes agrupadas sob a mesma nomenclatura. O novo estudo reforça essa ideia ao apresentar quatro perfis consistentes dentro do TEA.
Como a pesquisa foi conduzida
A base de dados
Cientistas analisaram milhares de casos de crianças diagnosticadas com autismo, comparando informações de comportamento, desenvolvimento cognitivo, habilidades motoras e genética.
O método estatístico
Utilizando técnicas avançadas de análise de dados, foi possível identificar padrões que se repetiam em grupos distintos. Esses padrões deram origem à divisão em quatro subtipos, cada qual com predominância de certos sintomas e trajetórias de desenvolvimento.
A validação dos resultados
Para garantir a consistência, os pesquisadores aplicaram a mesma metodologia em diferentes amostras, confirmando que os subtipos apareciam de forma semelhante em contextos variados.
Os quatro subtipos de autismo

1. Desafios sociais e comportamentais
Esse subtipo reúne crianças que apresentam as dificuldades clássicas do autismo — interação limitada e comportamentos repetitivos — mas que não exibem atrasos significativos no desenvolvimento da fala ou da coordenação motora. É o grupo mais numeroso, abrangendo aproximadamente 37% dos casos estudados.
Características principais:
- Presença marcante de ansiedade e TDAH como comorbidades
- Comunicação relativamente preservada
- Necessidade de suporte para habilidades sociais
2. Perfil misto com atraso no desenvolvimento
Cerca de 19% das crianças pertencem a essa categoria. Elas apresentam atraso para andar ou falar, mas não necessariamente exibem os sintomas mais intensos de outros subtipos.
Características principais:
- Dificuldades iniciais no desenvolvimento motor e da linguagem
- Menor presença de comorbidades psiquiátricas
- Evolução variável, dependendo da intervenção precoce
3. Desafios moderados
Esse grupo corresponde a 34% da amostra e é formado por indivíduos com sintomas mais leves. Muitos atingem marcos de desenvolvimento dentro do esperado e têm menos limitações na vida cotidiana.
Características principais:
- Funcionamento cognitivo próximo ao padrão
- Sintomas autísticos presentes, mas em grau brando
- Boa resposta a terapias de suporte
4. Amplamente afetados
A minoria dos casos, cerca de 10%, se encaixa nesse subtipo. Trata-se da forma mais severa, com atrasos intensos em múltiplas áreas.
Características principais:
- Grande dificuldade de comunicação
- Forte presença de comportamentos repetitivos
- Alta incidência de condições associadas, como epilepsia ou distúrbios de humor
- Alterações genéticas precoces detectadas em parte dos indivíduos
O papel da genética
Momento em que as mutações agem
Os cientistas observaram que os efeitos genéticos não ocorrem da mesma forma em todos os subtipos. Em alguns casos, alterações já se manifestam no desenvolvimento fetal; em outros, os impactos só aparecem mais tarde, durante a infância. Isso explica por que certos quadros são percebidos mais cedo e outros, de forma tardia.
Diferentes caminhos para o mesmo diagnóstico
Embora todos os perfis recebam a classificação de TEA, as rotas biológicas que levam ao transtorno parecem distintas. Isso reforça a ideia de que há “autismos”, e não apenas um autismo.
Por que essa descoberta é importante
Diagnósticos mais refinados
Com os subtipos, os médicos podem identificar não apenas se uma criança tem autismo, mas de qual tipo se trata. Isso facilita o planejamento de terapias, a previsão de necessidades futuras e a comunicação com famílias.
Terapias sob medida
Cada perfil pode responder melhor a certas abordagens. Crianças amplamente afetadas, por exemplo, podem necessitar de apoio multidisciplinar intensivo, enquanto aquelas com desafios moderados podem se beneficiar de intervenções focadas em habilidades sociais.
Políticas públicas mais eficientes
Conhecer a proporção de cada subtipo em uma população ajuda gestores de saúde e educação a planejar recursos: desde a criação de escolas inclusivas até a formação de profissionais especializados em perfis específicos.
Caminho para biomarcadores
Os subtipos podem auxiliar na busca por exames laboratoriais ou genéticos que ajudem a diagnosticar o autismo com mais rapidez e objetividade.
Limites e cuidados
Risco de estigmatização
Embora a classificação em subtipos traga avanços, também há o risco de que rótulos mais restritivos reforcem preconceitos. É fundamental usar a informação para promover inclusão, não para excluir.
Necessidade de mais pesquisas
O estudo foi robusto, mas ainda é cedo para afirmar que esses quatro subtipos explicam toda a diversidade do espectro. Novos trabalhos em diferentes países e culturas serão essenciais para confirmar a validade da tipologia.
Fronteiras nem sempre claras
Algumas crianças podem apresentar características de mais de um subtipo, o que mostra que as fronteiras entre eles não são absolutas.
O que esperar no futuro
Estudos longitudinais
Acompanhamentos de longo prazo ajudarão a entender como os subtipos evoluem ao longo da vida adulta e se podem mudar conforme as experiências e terapias recebidas.
Testes clínicos direcionados
A personalização de intervenções terá que ser validada em estudos clínicos, testando qual abordagem funciona melhor em cada subtipo.
Avanços em neuroimagem e inteligência artificial
Ferramentas como ressonância magnética funcional e algoritmos de IA podem identificar padrões cerebrais associados a cada subtipo, reforçando os critérios de diagnóstico.
Considerações finais
A identificação de quatro subtipos de autismo marca um avanço crucial na compreensão do espectro. Em vez de um diagnóstico homogêneo, agora a ciência começa a enxergar perfis diferenciados, cada um com necessidades específicas e histórias biológicas próprias. Essa nova visão pode transformar tanto a prática clínica quanto as políticas de inclusão, permitindo que cada pessoa com autismo receba o suporte de que realmente precisa. Mais do que classificar, o objetivo é respeitar a diversidade dentro do espectro e oferecer caminhos mais humanos e eficazes para acolher cada indivíduo e sua família.













