A volta do debate sobre o flúor na água
A adição de flúor à água potável, prática comum há décadas para prevenir cáries dentárias, voltou a gerar controvérsias em 2025. O tema, que parecia pacificado no campo da saúde pública, ressurgiu com força após novas decisões políticas nos Estados Unidos e o destaque de pesquisas recentes que colocaram em dúvida a segurança dessa medida.
O que está motivando essa reavaliação em alguns setores? Por que governos começaram a recuar? E o mais importante: há mesmo razão para preocupação? O Brasil, onde a fluoretação é obrigatória por lei, também está sendo impactado por esse novo ciclo de desconfiança.
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A origem da polêmica recente
Estudos recentes reacendem o alerta
Uma das causas da retomada do debate foi a publicação de novas pesquisas que sugerem possíveis impactos do flúor no desenvolvimento neurológico de crianças. Embora os resultados ainda estejam longe de serem conclusivos, os dados levantaram preocupações suficientes para embasar decisões políticas em estados norte-americanos como Flórida e Utah, que decidiram proibir a fluoretação da água em determinadas localidades.
Decisões políticas ganham repercussão internacional
O movimento desses estados influenciou discussões em outros países, inclusive no Brasil, onde grupos contrários à prática passaram a usar os mesmos argumentos. O tema ganhou as redes sociais, alimentado por vídeos, textos e teorias que nem sempre refletem o consenso científico.
O que é a fluoretação da água?
A fluoretação é o processo de adicionar compostos de flúor à água de abastecimento público com o objetivo de reduzir a incidência de cáries na população. Essa política foi adotada inicialmente nos Estados Unidos na década de 1940 e se espalhou pelo mundo como estratégia de saúde pública. No Brasil, é obrigatória por lei desde 1974, sempre dentro de concentrações consideradas seguras por órgãos reguladores.
A posição da ciência
Evidências acumuladas ao longo de décadas
Diversas instituições internacionais, como a Organização Mundial da Saúde (OMS), os Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA (CDC) e a Associação Dental Americana, continuam apoiando a fluoretação. O argumento é simples: quando aplicada em níveis corretos (geralmente entre 0,6 e 0,9 mg/L), a prática é eficaz na prevenção da cárie e não representa risco significativo à saúde.
O caso do Brasil: menos cárie com flúor
Estudos realizados em várias regiões do país indicam que a presença do flúor na água teve papel importante na redução das taxas de cárie ao longo das últimas décadas. A medida beneficia principalmente comunidades com menor acesso a serviços odontológicos e produtos com flúor, como cremes dentais.
Os riscos associados ao uso do flúor

Fluorose dentária: o efeito colateral mais comum
A principal consequência do consumo excessivo de flúor é a fluorose dentária, que causa manchas ou estrias nos dentes, geralmente de caráter estético. Esse efeito ocorre quando a ingestão de flúor acontece em doses elevadas durante a formação dos dentes, principalmente na infância.
Possíveis impactos em altas concentrações
Em quantidades muito acima do recomendado, o flúor pode causar problemas mais graves, como alterações ósseas e, em casos extremos, complicações neurológicas. No entanto, esses efeitos são observados em contextos onde a concentração de flúor é exageradamente alta — algo que não ocorre nos sistemas de abastecimento controlados por órgãos de saúde.
Grupos de maior sensibilidade
Pessoas com condições específicas, como doenças renais ou deficiência de iodo, podem ser mais suscetíveis aos efeitos do flúor. Por isso, há pesquisadores que defendem estudos mais amplos sobre impactos em populações vulneráveis, embora a fluoretação em níveis normais seja considerada segura pela maioria dos especialistas.
Como funciona o controle do flúor no Brasil
Limites definidos por lei
O Ministério da Saúde estabelece os parâmetros para o teor de flúor na água potável no Brasil. Os níveis são ajustados de acordo com a temperatura média da região, o que influencia o volume médio de ingestão de água pela população. As concentrações permitidas variam entre 0,6 e 0,9 miligramas por litro.
Monitoramento e fiscalização
As empresas responsáveis pelo fornecimento de água são obrigadas a realizar testes periódicos para garantir que os níveis estejam dentro do recomendado. Em algumas cidades, há ainda sistemas independentes de vigilância chamados de “heterocontrole”, realizados por universidades e instituições de pesquisa.
Por que a desinformação encontra espaço
Redes sociais e a amplificação do medo
Com o crescimento das plataformas digitais, boatos e teorias da conspiração se espalham com rapidez. Vídeos e publicações sensacionalistas que associam o flúor a doenças graves, como câncer ou autismo, ganham visibilidade, mesmo sem base científica. Essa desinformação dificulta o diálogo com a população e atrapalha campanhas de saúde pública.
A lacuna entre ciência e percepção pública
Mesmo com décadas de pesquisa sustentando a segurança da fluoretação, a percepção pública muitas vezes não acompanha os dados científicos. Isso se deve, em parte, à dificuldade em comunicar riscos reais de forma simples e à tendência humana de dar mais atenção a alertas negativos do que a estudos que demonstram segurança.
Alternativas à fluoretação
Flúor tópico: uso de cremes dentais e bochechos
Uma das alternativas sugeridas por críticos da fluoretação é o uso de produtos tópicos, como pastas de dente e enxaguantes bucais com flúor. Embora eficazes, esses métodos dependem do uso correto e regular, o que não acontece em todas as camadas sociais.
Fluoretação do sal
Alguns países adotam a fluoretação do sal de cozinha como substituição ao flúor na água. No entanto, esse modelo também apresenta desafios, especialmente quanto ao controle da dose ingerida, já que o consumo de sal varia muito de pessoa para pessoa.
O futuro da fluoretação
Pesquisas contínuas são essenciais
A ciência não é estática, e novas pesquisas devem sempre ser bem-vindas. Avaliar constantemente a segurança da fluoretação é uma forma de manter a confiança pública e garantir que a medida continue trazendo mais benefícios do que riscos.
Comunicação mais clara com a população
Cabe aos profissionais da saúde e às autoridades reforçarem a comunicação com a sociedade, explicando com transparência os critérios que sustentam o uso do flúor na água e combatendo informações falsas com base científica.
Considerações finais
A fluoretação da água continua sendo uma das ferramentas mais importantes da saúde pública na prevenção de cáries, especialmente em países com desigualdade no acesso a cuidados odontológicos. As recentes polêmicas em torno do tema, embora preocupantes, não anulam as décadas de evidência que demonstram sua eficácia e segurança, quando aplicada nos níveis corretos.
É importante que os debates sejam baseados em ciência, não em boatos. E que as políticas públicas, como a fluoretação, sejam constantemente avaliadas, mas sem decisões precipitadas que possam prejudicar milhões de brasileiros.


