Nos últimos meses, o TikTok e outras redes sociais impulsionaram uma tendência inusitada: o mouth taping, prática que consiste em colar fita adesiva na boca durante o sono. Defensores afirmam que o hábito estimula a respiração nasal, melhora a qualidade do descanso e até reduz roncos. Contudo, especialistas em sono, odontologia e otorrinolaringologia vêm a público com alertas contundentes: os riscos podem ser maiores que os supostos benefícios.
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O que é o mouth taping
A prática em detalhes
O método consiste em aplicar uma fita — geralmente cirúrgica ou hipoalergênica — sobre os lábios antes de dormir. O objetivo é forçar a respiração pelo nariz, considerada mais saudável por filtrar, aquecer e umidificar o ar inspirado.
Origem e popularização
Apesar de não ser totalmente novo, o mouth taping ganhou força com influenciadores digitais que exibem a prática como “hack de bem-estar” para noites mais restauradoras. Milhões de visualizações em vídeos curtos transformaram a técnica em tendência mundial.
Promessas difundidas nas redes
Entre os benefícios relatados por adeptos estão:
- redução do ronco
- melhora no hálito matinal
- sono mais profundo e reparador
- maior energia durante o dia
- menos episódios de boca seca
O que a ciência diz
Revisões científicas recentes
Pesquisas revisadas por pares ainda são escassas. Uma revisão sistemática publicada em 2025 avaliou pouco mais de 200 pacientes em estudos clínicos pequenos. Alguns resultados apontaram melhorias em índices de apneia leve, mas a maioria não encontrou diferenças significativas.
Evidências limitadas
Em termos científicos, não há comprovação robusta de que tapar a boca seja eficaz para todos. Os estudos existentes são restritos e muitas vezes excluem justamente os pacientes que mais buscam soluções para o ronco: aqueles com obstrução nasal ou apneia moderada a grave.
Críticas da comunidade médica
Especialistas afirmam que os relatos positivos compartilhados nas redes são, em grande parte, experiências individuais, não conclusões científicas. Para médicos do sono, a prática pode mascarar problemas sérios e atrasar diagnósticos fundamentais.
Os riscos do mouth taping
Possível sufocamento
Quem tem desvio de septo, rinite crônica ou sinusite pode enfrentar dificuldades graves ao bloquear a respiração oral. Nesse contexto, o risco de asfixia parcial não pode ser ignorado.
Piora de apneia do sono
Em indivíduos com apneia obstrutiva não diagnosticada, impedir a respiração pela boca pode intensificar pausas respiratórias e queda de oxigênio no sangue durante o sono.
Irritação na pele e desconforto psicológico
Fitas adesivas podem causar alergias, ressecamento e lesões nos lábios. Além disso, algumas pessoas relatam sensação de claustrofobia ou ansiedade ao dormir com a boca vedada.
Falsa sensação de segurança
Um dos maiores perigos é acreditar que o mouth taping substitui tratamentos médicos. Na prática, ele pode atrasar consultas com especialistas e o início de terapias eficazes.
Por que a respiração nasal é melhor
Benefícios naturais
Respirar pelo nariz é o padrão fisiológico mais saudável: o ar passa por um processo de filtragem, recebe umidade e chega aos pulmões em temperatura adequada. Além disso, a respiração nasal estimula a produção de óxido nítrico, que auxilia na dilatação dos vasos sanguíneos e melhora a oxigenação.
Consequências da respiração oral
Manter a boca aberta por longos períodos pode provocar:
- boca seca e mau hálito
- maior risco de cáries e gengivite
- dores de garganta frequentes
- fadiga ao acordar
Quando a boca assume o controle
A respiração oral costuma ser consequência de obstruções nasais ou hábitos adquiridos, como má postura. Colar os lábios não resolve a causa raiz, apenas mascara o sintoma.
Alternativas seguras ao mouth taping
Avaliação médica
Antes de adotar qualquer técnica, o ideal é consultar um otorrinolaringologista ou um médico do sono. Em muitos casos, o ronco é causado por problemas como desvio de septo ou alergias tratáveis.
Opções eficazes
- dilatadores nasais externos ou internos
- tiras nasais que facilitam a passagem de ar
- terapia miofuncional para fortalecer músculos da face
- tratamento de alergias e rinite
- uso de CPAP em casos confirmados de apneia
Hábitos que ajudam
Manter uma boa higiene do sono também contribui: evitar álcool e refeições pesadas à noite, dormir de lado e manter o ambiente bem ventilado são práticas seguras e eficazes.
A visão de especialistas

Médicos do sono
Profissionais reforçam que não existe consenso científico que justifique a adesão em massa ao mouth taping. Pelo contrário, há preocupação de que a técnica ganhe mais força pela viralização digital do que pela validação científica.
Dentistas
Odontologistas alertam para possíveis impactos na saúde bucal, como aumento da sensibilidade nos lábios e alterações na mucosa, além de riscos de feridas em pacientes que já usam aparelhos ou próteses.
Psicólogos
Para alguns indivíduos, dormir com a boca selada pode gerar ansiedade, prejudicando ainda mais a qualidade do sono.
Casos em que o perigo é maior
- pessoas com diagnóstico ou suspeita de apneia do sono
- indivíduos com obstruções nasais recorrentes
- crianças, cujo desenvolvimento craniofacial pode ser afetado
- idosos, por maior vulnerabilidade a hipóxia
O impacto das redes sociais
O papel do TikTok
Plataformas como TikTok e Instagram têm impulsionado a técnica como solução rápida e natural. Entretanto, o alcance massivo desses conteúdos supera em muito o nível de evidência disponível, criando um descompasso entre popularidade e segurança.
Influência nos jovens
Embora a maior parte dos relatos venha de adultos, adolescentes também têm aderido à prática, o que preocupa especialistas devido aos riscos de complicações.
Responsabilidade digital
Profissionais da saúde cobram maior responsabilidade de influenciadores ao recomendar práticas sem comprovação robusta, especialmente em temas de saúde.
O futuro da pesquisa sobre mouth taping
Estudos controlados
Pesquisadores defendem mais ensaios clínicos randomizados para avaliar com clareza a eficácia e segurança do método.
Biomarcadores do sono
Exames como polissonografia podem ajudar a medir de forma objetiva se a prática realmente melhora a oxigenação ou reduz eventos respiratórios.
Abordagem personalizada
Se houver algum benefício real, é provável que ele se aplique apenas a perfis específicos de pacientes. A generalização, nesse momento, é precipitada.
Considerações finais
O mouth taping é um exemplo clássico de como tendências digitais podem ganhar força sem respaldo científico suficiente. Enquanto alguns relatam melhorias subjetivas, a comunidade médica mantém postura cautelosa e recomenda evitar a prática sem acompanhamento. Respiração nasal, de fato, é preferível à oral, mas colar os lábios não resolve problemas estruturais ou clínicos que dificultam essa função.
Para quem sofre com ronco, boca seca ou sono agitado, o caminho mais seguro continua sendo procurar diagnóstico especializado e investir em tratamentos validados. O apelo das redes sociais pode ser forte, mas quando se trata de saúde, é fundamental priorizar a ciência.


