Ser negro no Brasil não é fácil. É uma luta diária que só quem enfrenta sabe o quanto é exaustivo, triste e por vezes, revoltante. Talvez o racismo nem tenha sido o motivo para o que aconteceu em um supermercado Pão de Açúcar, na noite desse domingo, 11, na zona sul de São Paulo. Mas, Luciana Cruz Simões, de 36 anos, acredita que sim.
Por volta das 23h30 desse dia, seu filho, um adolescente de 16 anos, foi até o local para comprar algumas coisas. De acordo com Luciana, o menino acabou levando um chocolate sem pagar. Na saída, foi abordado por seguranças que perguntaram: “Você sabe o que fez, né?”
Nisso, o menino respondeu que sabia que tinha errado e ia pagar pelo produto. Para a UOL, Luciana contou que os seguranças não deram essa opção: disseram que iam levá-lo para uma salinha. Com medo, ele disse que gritaria se os profissionais se aproximassem, alegando novamente que pagaria o chocolate. Sua mãe compartilhou o ocorrido nas redes sociais e em pouco tempo a repercussão foi enorme. A postagem foi apagada depois.
“Quando ele [o filho] disse que ia gritar, os seguranças ficaram com raiva e falaram: ‘Ah, é? Se gritar, vai apanhar mais'”, conta Luciana. Depois disso, o menino levou socos no rosto e nariz. Além disso, os seguranças usaram uma arma de air-soft, que dispara um objeto de plástico. Ele teve que pagar o valor do chocolate.
“Ficaram 10 minutos [agredindo]. Entre as agressões, eles [seguranças] falavam: ‘A gente conhece malandrinho que nem você'”, diz Luciana. Ela, que é branca, acredita que o ato foi racismo contra o filho, negro:

“Isso aconteceria com um branco? Levo meus filhos em supermercado desde quando eles eram crianças. Antes, achavam que eram meninos de rua. Agora, bandidos”, disse.
Mãe denuncia agressões:
“Não estava em casa [no momento da agressão]. Quando cheguei, já o vi machucado. Ele estava bem arrasado. Tinha dito que as marcas no rosto haviam sido de uma briga em um bloco de Carnaval. Estranhei, porque ele é tranquilo. Insisti muito, até que o irmão dele, gêmeo, falou que foi o segurança do mercado. Ele não me queria contar o que tinha acontecido por vergonha”, conta a mãe. Ela foi até o mercado cobrar explicações e o chefe de segurança do Pão de Açúcar contou que os funcionários foram demitidos. O gerente se desculpou e em nota o Grupo Pão de Açúcar confirmou a demissão dos seguranças, dizendo que não compactua com situações de violência:

“Assim que tomou conhecimento do caso, a rede instaurou um processo interno de apuração, notificando a empresa a prestar todos os esclarecimentos e afastando imediatamente os envolvidos, até que o caso seja esclarecido junto aos órgãos competentes. Além disso, procedeu com o reforço dos processos internos de conduta”, diz parte da nota do Pão de Açúcar.
A mãe fez um BO – Boletim de Ocorrência por lesão corporal. Um inquérito foi aberto e o adolescente, levado para o hospital. Segundo Luciana, ela irá processar o supermercado.
Empresa terceirizada:
De acordo com a empresa terceirizada Grupo G8 Comando, que é responsável pela administração dos seguranças que atuam na unidade do Pão de Açúcar, os funcionários acusados foram demitidos.
“O grupo não tolera qualquer suspeita de desvio de conduta de seus colaboradores e, ainda em respeito às políticas exigidas pelo Pão de Açúcar para os seguranças em suas lojas, desligou imediatamente os três colaboradores envolvidos no relato da unidade do Jabaquara. Paralelamente a essa decisão, a companhia abriu uma sindicância interna para apurar o ocorrido e tomar as demais medidas necessárias”, disseram em nota.
A atitude do adolescente não foi correta, claro. Mas, esse tipo de posicionamento, usando da violência para conter uma situação tão simples é revoltante. Talvez o preconceito ainda esteja impregnado na sociedade, velado, e se torna evidente em momentos como esse.
Foto: Reprodução/ Arquivo Pessoal/ Facebook
Fonte: Uol












