Crítica sem spoilers
“Cortina de Fumaça”, nova aposta da Apple TV+, estreou em junho de 2025 e rapidamente se tornou um dos assuntos mais comentados no catálogo da plataforma. A série, dividida em nove episódios, combina investigação policial, tensão psicológica e dilemas morais, tudo sob a direção criativa de Dennis Lehane, escritor e roteirista já aclamado em projetos como “Black Bird” e “Ilha do Medo”. A produção se apoia em um ritmo lento e atmosférico, que exige paciência do espectador, mas recompensa com momentos de grande impacto emocional e narrativo.
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O enredo
A história acompanha Dave Gudsen, um investigador de incêndios interpretado por Taron Egerton, que passa a trabalhar ao lado da detetive Michelle Calderone, vivida por Jurnee Smollett. Juntos, eles mergulham em uma caçada perigosa para deter incendiários em série que espalham medo pela comunidade. No entanto, a investigação logo se transforma em algo maior: segredos vêm à tona, alianças são testadas e as chamas revelam verdades perturbadoras sobre todos os envolvidos.
Fatos inspiradores
A série não se limita à ficção pura. Sua base é inspirada no notório caso de John Leonard Orr, um bombeiro norte-americano que também atuava como incendiário, e que foi tema do podcast “Firebug”. Embora não siga a história de forma literal, “Cortina de Fumaça” utiliza esse pano de fundo real para criar uma narrativa própria, explorando mais os dilemas psicológicos do que os fatos policiais em si. Esse aspecto torna a série ainda mais instigante, pois joga o foco sobre o que leva alguém a ultrapassar limites morais e cometer crimes dessa natureza.
A força criativa de Dennis Lehane

Um olhar sobre a mente humana
Lehane é conhecido por sua capacidade de transformar dramas policiais em retratos intensos da condição humana. Em “Cortina de Fumaça”, ele repete a fórmula ao conduzir o espectador por uma jornada que vai além do simples mistério de identificar o criminoso. O verdadeiro interesse está em compreender as motivações e a complexidade emocional dos personagens, revelando como traumas, ambições e sentimentos reprimidos podem se transformar em combustíveis para decisões destrutivas.
Estrutura narrativa
A série adota um ritmo cadenciado, também chamado de slow-burn. Isso significa que a ação não é imediata, mas construída de forma progressiva. Os primeiros episódios funcionam como preparação, estabelecendo personagens e contexto. Conforme a temporada avança, as tensões aumentam e as revelações tornam a trama cada vez mais imprevisível. Essa escolha pode afastar espectadores ansiosos por respostas rápidas, mas é justamente ela que dá profundidade e autenticidade à narrativa.
Elenco e atuações
Protagonistas em sintonia
Taron Egerton interpreta Gudsen com intensidade contida, transmitindo em olhares e silêncios os conflitos de um homem dividido entre dever e fragilidade. Já Jurnee Smollett imprime energia e pragmatismo à detetive Calderone, equilibrando a narrativa ao funcionar como contraponto direto ao parceiro. Juntos, eles constroem uma dinâmica crível, marcada por tensão, respeito e desconfiança.
Apoio de peso
Greg Kinnear surge como uma figura de autoridade ambígua, cujas intenções nem sempre ficam claras. John Leguizamo entrega uma atuação magnética, que adiciona imprevisibilidade à trama. Já Rafe Spall e Ntare Guma Mbaho Mwine completam o núcleo coadjuvante, trazendo diferentes camadas de vulnerabilidade e ameaça. Esse conjunto ajuda a expandir o universo da série e intensificar a sensação de que ninguém está livre de contradições.
Estrutura e ritmo
Uma história que cresce aos poucos
Os episódios iniciais podem parecer lentos, mas esse início deliberado é essencial para que a série alcance seu ápice de tensão. A cada capítulo, novos elementos são adicionados, e as relações entre os personagens se tornam mais complexas. O espectador percebe que, mais do que investigar incêndios, a narrativa quer explorar a combustão interna de cada indivíduo.
A revelação precoce
Um dos pontos mais ousados do roteiro é a decisão de antecipar uma revelação significativa logo no começo da temporada. Esse recurso rompe com a expectativa tradicional dos thrillers policiais, que normalmente seguram seus segredos até o final. Ao fazer isso, a série desloca a atenção do público do “quem fez” para o “por que fez”, tornando a experiência mais psicológica do que investigativa.
Detalhes técnicos
“Cortina de Fumaça” conta com nove episódios, cada um variando entre 42 e 65 minutos. Os dois primeiros estrearam em 27 de junho de 2025, enquanto os demais foram lançados semanalmente, sempre às sextas-feiras, até 15 de agosto do mesmo ano. Essa estratégia de lançamento manteve o suspense vivo, gerando debate constante entre os espectadores.
Impacto cultural e recepção
Desde sua estreia, a série tem sido comparada a outras produções de sucesso da Apple TV+, como “Black Bird”. Críticos elogiaram a forma como Lehane constrói atmosferas densas e personagens multifacetados, ainda que alguns apontem que o ritmo lento pode não agradar a todos. Entre o público, o consenso é que a série exige dedicação, mas oferece uma experiência imersiva e reflexiva, que vai além do entretenimento convencional.
Considerações finais
“Cortina de Fumaça” não é apenas mais um drama policial. É um estudo sobre identidade, culpa e os impulsos humanos que se escondem sob a superfície. Com atuações sólidas, roteiro inteligente e direção cuidadosa, a série confirma a Apple TV+ como uma das plataformas mais consistentes quando o assunto é conteúdo de qualidade. Para quem busca uma narrativa complexa, repleta de nuances e metáforas, esta produção é um prato cheio.













