Adoçantes deixam de ser “inofensivos”: o que a ciência descobriu
Durante décadas, os adoçantes artificiais foram vistos como aliados de quem buscava reduzir calorias e controlar o açúcar no sangue. Porém, estudos recentes começaram a colocar essa imagem em xeque. Pesquisadores têm identificado que essas substâncias, embora pareçam inofensivas, podem provocar efeitos inesperados no metabolismo e no funcionamento do cérebro.
Uma das pesquisas mais citadas, publicada na revista Nature Metabolism, indica que o consumo de adoçantes como a sucralose pode confundir o cérebro e aumentar a sensação de fome, mesmo sem fornecer energia real. Outra análise, realizada por cientistas brasileiros da USP, aponta que o uso frequente desses produtos pode estar ligado a um declínio cognitivo mais acelerado, com prejuízos à memória e à fluência verbal.
Essas descobertas sugerem que o uso indiscriminado de adoçantes merece uma reavaliação — especialmente por pessoas que acreditavam estar fazendo uma escolha mais saudável ao substituir o açúcar.
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O que os novos estudos mostram
Adoçantes e o cérebro: uma confusão de sinais
Os voluntários do estudo da Nature Metabolism foram divididos em grupos que consumiram três tipos de bebidas: água pura, água adoçada com açúcar e água adoçada com sucralose. Após exames cerebrais, observou-se que a sucralose ativava áreas do cérebro relacionadas à fome e ao desejo por comida. Já o açúcar, ao contrário, reduzia essa atividade, indicando que o corpo reconheceu o aporte calórico.
Esse resultado reforça a teoria de que o cérebro reage ao sabor doce esperando energia. Quando essa energia não chega — como acontece com adoçantes sem calorias —, o organismo pode compensar aumentando o apetite, o que favorece o ganho de peso.
Declínio cognitivo associado ao uso contínuo
Pesquisadores da USP analisaram mais de 12 mil pessoas ao longo de oito anos e observaram que o consumo constante de adoçantes estava associado a um desempenho cognitivo inferior com o passar do tempo. Os participantes que usavam adoçantes diariamente apresentaram queda mais acentuada em memória e linguagem.
Os efeitos foram mais evidentes entre indivíduos mais jovens e em pessoas com diabetes — grupos que tendem a consumir mais produtos “zero” ou “diet”.
Substâncias avaliadas
Os estudos analisaram adoçantes comuns como sucralose, aspartame, sacarina, acessulfame-K, eritritol e xilitol. Embora o risco varie conforme o tipo e a quantidade, todos apresentaram possíveis efeitos adversos quando usados em excesso.
Por que os adoçantes podem ser prejudiciais

Sinalização confusa entre paladar e energia
O sabor doce é um sinal biológico que indica ao cérebro a chegada de calorias. Quando o corpo percebe esse sabor, mas não recebe energia, o sistema metabólico pode ficar desregulado. Essa discrepância pode gerar mais fome, dificuldade em controlar a glicose e até compulsão alimentar.
Alterações na microbiota intestinal
Pesquisas também sugerem que adoçantes podem afetar as bactérias do intestino, alterando o equilíbrio da flora intestinal. Isso pode impactar o metabolismo, a imunidade e até a comunicação entre intestino e cérebro, processo conhecido como “eixo intestino-cérebro”.
Possível impacto neurológico
Alguns compostos derivados da metabolização dos adoçantes podem causar inflamação e estresse oxidativo, especialmente quando consumidos de forma contínua. Esses efeitos, embora ainda em estudo, podem contribuir para o envelhecimento precoce das células cerebrais.
Principais adoçantes e seus riscos conhecidos
Sucralose
É um dos adoçantes mais populares do mercado e até 600 vezes mais doce que o açúcar. Apesar de ser considerada estável, estudos apontam que a sucralose pode alterar a microbiota intestinal e liberar compostos tóxicos quando aquecida por longos períodos.
Aspartame
Usado em refrigerantes e produtos “diet”, o aspartame é metabolizado em substâncias como metanol e fenilalanina. Pessoas com fenilcetonúria devem evitá-lo completamente. Pesquisas recentes também relacionam o uso prolongado do aspartame a dores de cabeça e distúrbios de humor.
Sacarina e Acessulfame-K
A sacarina é um dos adoçantes artificiais mais antigos, mas ainda levanta dúvidas sobre seus efeitos no intestino. O acessulfame-K, bastante usado em produtos industrializados, não é metabolizado pelo corpo, o que faz com que seu impacto a longo prazo ainda seja incerto.
Xilitol e eritritol
Embora considerados adoçantes “naturais”, esses poliálcoois também podem causar desconfortos intestinais e, em grandes quantidades, interferir na absorção de nutrientes.
O que dizem os especialistas
O uso deve ser moderado
Médicos e nutricionistas reforçam que o consumo de adoçantes pode ser seguro desde que respeitados os limites diários recomendados por órgãos como a Anvisa e a OMS. O problema está na alta exposição: refrigerantes, iogurtes, balas, gomas de mascar e até medicamentos podem conter adoçantes, aumentando o consumo total sem que o consumidor perceba.
Prefira alternativas naturais
Stevia, mel, açúcar de coco e frutas secas são opções mais seguras e menos processadas, embora também devam ser usadas com moderação. O ideal é reduzir gradualmente a necessidade de sabores muito doces na alimentação.
Cuidado ao cozinhar
Nem todos os adoçantes resistem ao calor. A sucralose, por exemplo, pode liberar substâncias potencialmente tóxicas quando aquecida a altas temperaturas. Por isso, ela não deve ser usada em receitas que vão ao forno ou fogão.
O que ainda não foi comprovado
Apesar dos resultados alarmantes, os cientistas ressaltam que ainda há lacunas importantes. A maioria dos estudos é observacional e não prova uma relação direta de causa e efeito. Além disso, fatores como estilo de vida, alimentação geral e predisposição genética podem influenciar os resultados.
Mesmo assim, o acúmulo de evidências tem levado especialistas a defender mais prudência no consumo desses produtos — principalmente entre pessoas que fazem uso diário e prolongado.
O papel das agências reguladoras
Atualmente, agências como a Anvisa, a FDA (nos Estados Unidos) e a EFSA (na Europa) ainda consideram os adoçantes seguros dentro dos limites de ingestão diária aceitáveis. No entanto, essas instituições reavaliam periodicamente os estudos disponíveis e podem revisar as normas caso surjam novas evidências.
Enquanto isso, o consenso é claro: adoçantes não são isentos de riscos e devem ser usados apenas quando realmente necessários.
Como reduzir o consumo de adoçantes no dia a dia
1. Reeduque o paladar
Diminua gradualmente a quantidade de açúcar e adoçante usada nas bebidas. Com o tempo, o paladar se adapta e o corpo passa a sentir menos necessidade do sabor doce.
2. Priorize alimentos naturais
Frutas frescas, cereais integrais e refeições caseiras ajudam a reduzir o desejo por doces e diminuem a exposição a produtos industrializados ricos em adoçantes.
3. Leia rótulos com atenção
Produtos com as palavras “zero açúcar” ou “light” nem sempre são mais saudáveis. Verifique a lista de ingredientes e evite o consumo exagerado.
4. Use especiarias como substitutos
Canela, baunilha e cacau em pó podem realçar o sabor dos alimentos naturalmente, sem necessidade de adoçantes.
Considerações finais
A ideia de que adoçantes são substitutos completamente seguros do açúcar está sendo desafiada por novas evidências científicas. Embora não seja necessário eliminá-los por completo, o consumo frequente e em grandes quantidades pode trazer riscos para o metabolismo e o cérebro.
O melhor caminho é buscar equilíbrio: reduzir o uso, preferir versões naturais e manter uma alimentação rica em alimentos frescos e minimamente processados. Afinal, o verdadeiro sabor da saúde está na moderação e na informação.