Nos próximos meses, o cenário do entretenimento digital no Brasil poderá passar por uma transformação relevante. Uma proposta em discussão no Congresso Nacional busca criar regras específicas para serviços de streaming, como Netflix, Prime Video, Disney+ e outros. Trata-se do Projeto de Lei 2331/2022, também chamado de “Lei do Streaming”, que tem como objetivo principal regulamentar esse mercado em crescimento e fortalecer o setor audiovisual brasileiro.
A proposta, porém, divide opiniões: ao mesmo tempo em que é vista como uma forma de valorizar produções nacionais, também é alvo de críticas por gerar possíveis aumentos nas mensalidades e desafios operacionais às plataformas.
Leia Mais:
O que diz o Projeto de Lei 2331/2022
Impostos e novas obrigações
O texto propõe a criação de uma cobrança específica sobre os serviços de vídeo por demanda — ou seja, aqueles oferecidos por plataformas de streaming. O tributo em questão seria a Condecine VoD, um tipo de contribuição já existente para o setor audiovisual, mas que passaria a ser aplicada também a empresas estrangeiras de tecnologia que atuam no Brasil.
A alíquota da Condecine seria definida de acordo com o faturamento anual da empresa:
- Até R$ 4,8 milhões ao ano: isenção da taxa;
- Entre R$ 4,8 milhões e R$ 96 milhões: alíquota de 3%;
- Acima de R$ 96 milhões: alíquota de 6% sobre a receita.
A arrecadação desse imposto seria destinada ao fomento de produções audiovisuais brasileiras, especialmente de produtoras independentes.
Incentivo à produção local: mais conteúdo nacional nos catálogos
Cota mínima de 10% para obras brasileiras
Além da taxação, o projeto estabelece que as plataformas de streaming deverão reservar pelo menos 10% de seus catálogos para obras brasileiras. Isso inclui filmes, séries, documentários e programas produzidos por profissionais e empresas locais.
Essa exigência busca ampliar a presença da cultura nacional no ambiente digital, promovendo diversidade e representatividade nas produções oferecidas ao público.
Descontos para quem investir no Brasil
Empresas que optarem por financiar diretamente produções nacionais poderão receber um desconto de até 60% na Condecine VoD, tornando o investimento em conteúdo brasileiro uma alternativa vantajosa para quem atua no país.
Como isso afeta empresas como Netflix e Prime Video
Aumento de custos operacionais
Se aprovada, a nova legislação exigirá que empresas internacionais que oferecem seus serviços por streaming passem a incorporar essas obrigações fiscais e de conteúdo local. Na prática, isso pode significar o aumento da carga tributária, que já inclui PIS, Cofins e ISS.
Somando todos esses encargos, a tributação para serviços de streaming no Brasil pode ultrapassar 20% do faturamento bruto.
Adaptação do acervo às exigências nacionais
Outro desafio será manter a proporção de obras brasileiras exigida por lei. Algumas plataformas já investem em conteúdo nacional, mas outras precisarão correr atrás do prejuízo. Isso pode levar a uma revisão completa de seus catálogos e a uma busca por produções locais que atendam aos critérios definidos.
Impacto direto no consumidor final

Mensalidades mais altas no horizonte?
Com o aumento de custos e investimentos obrigatórios, é possível que as plataformas decidam repassar parte das despesas para os usuários, resultando em assinaturas mais caras. Estimativas preliminares apontam para possíveis reajustes entre 10% e 15%, dependendo da empresa e da estratégia adotada.
Mais variedade de conteúdo nacional
Por outro lado, o consumidor também pode se beneficiar. Com mais obras brasileiras nos catálogos, será possível ter acesso a produções independentes, novos talentos e histórias que dialogam diretamente com a realidade e a cultura do país. Essa mudança também pode impulsionar a exportação de conteúdo brasileiro para o exterior.
A visão do setor e do governo
Apoiadores da regulação
Diversos profissionais do setor audiovisual apoiam o projeto, por enxergarem na regulamentação uma forma de garantir espaço para a produção nacional frente à hegemonia de conteúdos estrangeiros. Eles defendem que, assim como emissoras de TV têm obrigações com conteúdo local, plataformas de streaming também devem seguir regras similares.
Críticas à proposta
Por outro lado, representantes das big techs e de empresas do setor argumentam que a proposta pode inviabilizar o crescimento dos serviços no país. Eles afirmam que a legislação atual já impõe tributos suficientes e que a cota de conteúdo pode limitar a liberdade de curadoria e dificultar a personalização da experiência do usuário.
Busca por um equilíbrio
O Ministério da Cultura tem atuado como mediador do debate, tentando encontrar um meio-termo entre a valorização da produção nacional e a manutenção da atratividade do mercado brasileiro para as plataformas de tecnologia. A expectativa é que uma versão final da lei contemple ajustes para evitar efeitos colaterais indesejados.
O que falta para a proposta virar lei
O PL 2331/2022 já foi aprovado pela Comissão de Assuntos Econômicos do Senado e está agora sob análise da Câmara dos Deputados. Caso receba o aval dos parlamentares, o texto segue para sanção presidencial.
Embora ainda possa passar por modificações, a tendência é que a regulação do setor de streaming seja aprovada em algum formato — seja por meio deste projeto ou de uma proposta alternativa.
Precedentes internacionais
Outros países também já caminham nessa direção. Na Europa, por exemplo, a União Europeia impõe que pelo menos 30% do conteúdo oferecido por plataformas de vídeo seja de origem europeia. O Canadá exige investimentos obrigatórios em conteúdo local, e a Coreia do Sul discute regras semelhantes.
Essas experiências mostram que a regulamentação do setor de streaming é uma tendência global, impulsionada tanto por questões culturais quanto econômicas.
Considerações finais
A proposta de regulamentar as plataformas de streaming no Brasil representa uma mudança importante para um mercado em rápida expansão. Com novos impostos e exigências de conteúdo nacional, o objetivo é equilibrar a presença de grandes empresas globais com a valorização da produção local.
Apesar das incertezas sobre o impacto no preço das assinaturas e na operação das plataformas, o debate em torno do PL 2331/2022 abre espaço para a construção de um ecossistema audiovisual mais justo, diverso e representativo — onde tanto criadores quanto consumidores possam sair ganhando.













